Parte II de VI . Junho 2017
20.05.2017, Rogério
Olá Dinis,
Passou um mês e meio desde a nossa última correspondência;
gostaria de retomá-la, aprofundando o único projecto integrante da tua
curadoria que se encontra em curso. Refiro-me a “Uma Dança por Mês”, ciclo de
encontros de experimentação de uma determinada técnica ou prática da dança que
visa promover a construção de um lugar comunitário para a experimentação e
entendimento do movimento. O Cine-Teatro António Lamoso, em Santa Maria da
Feira, já acolheu duas sessões (danças orientais em Abril e tai chiem
Maio). Uma sessão dedicada ao parkour está agendada para o mês de
Junho. Gostaria que pudesses elaborar um pouco em torno da importância deste
ciclo. Que lugar comunitário é este que o BCN pretende
criar em Santa Maria da Feira? E quem é que o vai habitar?
R
25.05.2017, Dinis
Propus este ciclo como uma forma de diálogo com a comunidade
local de Santa Maria da Feira, onde o BCN tem sede. Parece-me evidente que a
relação do espectador com o espectáculo de dança depende da sua relação com a
Dança, da relação com o seu próprio corpo, ou seja, da sua experiência de
dança: todos temos uma experiência de dança, que pode vir de aulas de
dança, de dançar numa discoteca, ou de pertencer ao grupo folclórico da terra.
Tenho vindo a reparar que existe, por vezes, uma relação muito metafórica com
os trabalhos; os espectadores tentam por tudo encontrar uma mensagem, ainda que
nem todos os espectáculos de dança proponham isso. Muitos espectáculos propõem
dramaturgias intrínsecas aos modos de fazer dança: como se dança?, o que se
dança?, como se produz uma dança?, quão improvisada, praticada ou fixa é uma
dança?. Essas questões criam a dramaturgia da dança, e se há espectáculos onde
essa dramaturgia intrínseca se acumula com uma mensagem veiculada, há outros,
como aqueles que proponho para esta curadoria, que estabelecem a sua própria
estrutura e prática como centro dramatúrgico. Nesse sentido, a minha ideia com
este ciclo consiste em convidar o público, uma vez por mês, a experimentar um
paradigma de dança ou uma prática de movimento. Um convite ao público de Santa
Maria da Feira para que dirija o seu olhar em relação aos espectáculos que
propomos para a dramaturgia do seu fazer, e não tanto para a mensagem que o
espectáculo possa conter. Um convite a que cheguem aos nossos espectáculos
deste ano com as perguntas “Que dança é esta?” e “Como se dança esta dança?” em
vez de “O que é que esta dança quer dizer?”.
Abraço,
Dinis