1/02/2007

PeepShow de Joana Nossa


Quatro personagens são construídas por quatro intérpretes num espaço fechado e contido, num universo que remete para as vivências algo marginais, nocturnas, no limite da perversidade e do interdito.
Estas personagens são colocadas como se de uma máscara se tratasse, uma persona, ao mesmo tempo narcísica e exibicionista que existe porque existe um outro que a observa.
Um trabalho íntimo e com tanto de pessoal como de personalizado que assenta como uma luva de latex negro aos seus quatro intérpretes.

Concepção e composição coreográfica | Joana Nossa
Criação e interpretação | Susana Otero, Diana Silva, Joana Nossa e Rui Marques
Desenho de Luzes | José Machado
Colagem musical | Joana Nossa
Desenho de Figurinos | Joana Nossa
Design Gráfico e fotografias: |Patrícia Costa
Produção | Ballet Contemporâneo do Norte

Apresentações
2007

-30 de Novembro, Estaleiro Teatral de Aveiro, Aveiro
-16 de Novembro, Cine Teatro António Lamoso, Santa Maria da Feira
-28 Abril, Cine Teatro de Águeda, Águeda

2006

-27 de Setembro, Festival Contra Dança, Covilhã.
-25 de Agosto, Feria de Teatro, Teatro Nuevo, Ciudad Rodrigo, Espanha.
-8 de Julho, Centro de Artes do Espectáculo, Portalegre.
-29 de Abril, Dia Mundial da Dança, Centro Cultural da Malaposta, Odivelas
-22 de Abril, Corpo Visível, Centro de Artes e Espectáculos, Figueira da Foz

2005

-17, 18, 19 e 20 de Novembro no Espaço BCN, Estarreja.
-14 e 15 de Outubro , VIII Semana da Dança Contemporânea de Estarreja – Cine Teatro de Estarreja.
-Estreia mundial a 14 de Outubro, no Cine Teatro de Estarreja

TEOLOGIA DA QUEDA de Luís Carolino

Teologia, s. f. (gr. Theologia). Ciência da religião, das coisas divinas.

Queda, s. f.. Acto ou efeito de cair. Decadência ruína. Descrédito. Culpa, pecado. Tendência, inclinação. Cessação, termo.

É muito intrigante o facto, surpreendentemente teatral, de um anjo que «cai» da graça do Senhor se transformar num demónio; como é que algo, por definição, intrinsecamente puro e bom, se transforma em algo, por definição, intrinsecamente mau? Por que mecanismo? Por que mistério?
A queda de graça ou ascensão ao estado de graça, é uma metáfora de transformação. Todos nós atravessamos momentos de maior ou menor transformação na nossa vida, de maior ou menor «queda», de maior ou menor ascensão.
Talvez o que seja determinante no processo de transformação seja, finalmente, o livre arbítrio; afinal, se não temos, por vezes, controlo sobre o que nos acontece e quando nos acontece, temos sempre algum poder de escolha no tipo de reacção que optamos por ter face ao que nos acontece.
Complicado conhecimento este, difícil aprendizagem; entre a queda e a ascensão um lugar de calmaria: ponto neutro da existência. É neste lugar que se desenrola o mistério desta Teologia da Queda.
Num espaço vazio, tornado confortável e vagamente interior por um grande quadrado de pele, simultaneamente definidor do lugar ritual da representação e garante de uma certa pureza dada a sua brancura, habitam temporariamente cinco personagens — como temporário é tudo na vida do humano e, forçosamente, num palco.
Cassandra, que tudo vê e sabe, premonitória, bendita e amaldiçoada; a única que sabe o caminho e a mais perdida; a única a quem foi dado ver e por isso cega.
Os Gémeos, uma revisitação do mito de Adão e Eva. Par seminal que de uma paz edílica inicial termina separado: Eva em seu jardim, a Rosa entre rosas, um caminho de espinhos como preço pelo conhecimento cobiçado; Adão num jardim de pedras, mais só do que no primeiro dia da criação, só apesar do produto da sua costela, carne da sua carne, sangue do seu sangue, para sempre dele separado, para sempre dele inseparável.
Pelo meio uma Criança e um Cão; a nossa inocência mais ou menos perdida, mais ou menos ameaçada; e a nossa eterna solidão de cães errantes sempre famintos de consolo.
Lucifer a mais perfeita de todas as criaturas de Deus revoltou-se quando soube que Deus tinha criado o Homem à sua imagem e semelhança. Cometeu o pecado do orgulho e caiu da graça do Senhor transformando-se num demónio — no Demónio.
A Queda como metáfora de transformação, de morte, portanto.
O conhecimento daquilo que se não pode conhecer: o conhecimento de Deus, o conhecimento do absoluto, do infinito: a Teologia da Queda.

Luís Carolino

1/01/2007

7 PERSONAGENS EM HORA DE PONTA de Elisa Worm

                                   Fotografia de Edgar Tavares


7 Personagens em hora de ponta assenta na construção e/ou na desconstrução dos muitos personagens que guardamos dentro de nós, não deixando de ser mais um número ou menos um número, enquanto urbe anónima que por obrigação abandona os seus sonhos de adolescente para se tornar na máquina infernal da sobrevivência.
Vai para o trabalho, vem do trabalho.
Vai para a escola, vem da escola.
Vai para a universidade, vem da universidade, se queres ser alguém na vida.
Esquece o teu raciocínio, os teus sentimentos, a tua necessidade de afecto. Zanga-te contigo próprio. Torna a vida dos mais atentos num inferno. Torna insuportável a tua relação de amor ou de simples afecto. Esquece-te de ti próprio sempre na esperança de que, depois da morte, outra vida haverá que te amparará entre ternas paredes, como se ainda estivesses no ventre da tua mãe.
Elisa Worm, 2008


Criação, Direcção, e Composição Coreográfica Elisa Worm
Assistente de Direcção Luis Carolino
Consultor Musical Pedro Carneiro
Vídeo Pedro Baptista
Banda Sonora e Sonoplastia  Elisa Worm/Pedro Carneiro
Interpretação e Criação  Susana Otero, Rui Marques, Sara Leite e Flávio Rodrigues
Participação Especial Vânia Almeida, Mafalda Estela, José Duarte, Alison Fernandes, Kelly Fernandes, Joana Gonçalves, Fábio Guedes, Marcelo Robalinho, Adriana Santiago, Briana Santos, Cláudio Silva, Marlene Silva e Tânia Silva
Figurinos Luis Carolino / Elisa Worm
Espaço Cénico  Elisa Worm
Desenho de Luz João Teixeira
Adereços José Machado
Caixa de Engraxador Ricardo Santos
Design Gráfico Patricia Costa

PONTO AMARELO EM FUNDO NEGRO (COM OBSERVADOR) de Andreas Dyrdal



Ao criar uma obra de arte, envolvemo-nos essencialmente com processos que são destilações, complicações e substrações pessoais de contextos mais alargados, próprios de um determinado momento no tempo; ou, sucintamente, decidimos o que incluir ou o que excluir de modo a justificar (para nós próprios) a existência da obra num determinado momento de uma janela temporal pessoal.
Quando a obra é mostrada, encontramo-nos na situação de ser interpretados por indivíduos ou por grupos de pessoas; ser-nos-ão atribuídos significados, opiniões, emoções e formas que não são, necessariamente nossas. Algures entre estes estados (a criação e o consumo) reside, para mim a mudança, a mudança contextual.
O momento de mudança é o que me interessa, o momento em que algo pessoal se transforma em algo público e vice versa; o momento, quando o pessoal ou colectivo, está prestes a surgir em nós, ou a deixar de existir, devido a reorganizações de contexto pessoais ou colectivas .
Quero encontrar essa aresta, essa linha, e/ou esse equilíbrio, e criar, a partir daí, a possibilidade de me envolver com o momento de mudança a partir do interior. Envolver-me com a produção que constantemente pode surgir, e questionar o problema do consumo.
Perguntar o que motiva o quê numa obra?
A pessoa de um intérprete ou o entendimento colectivo?
Onde colocar a linha entre o pessoal e o colectivo?
Entre intérprete e público? Entre a obra e o exterior?
E perguntar o que acontece quando as coisas mudam?, quando a mudança se torna um fim em si mesma e não um resultado da produção.
Andreas Dyrdal
Setembro 2011


Concepção, direção e coreografia | Andreas Dyrdal
Interpretação e criação | Susana Otero, Sara Leite, Rui Marques e Flávio Rodrigues
Texto | Susana Otero, Sara Leite, Rui Marques e Flávio Rodrigues
Desenho de Luz | João Teixeira
Figurinos | Andreas Dyrdal
Design Gráfico | Patricia Costa
Produção BCN

A NOTÍCIA DA MINHA MORTE FOI UM EXAGERO de Susana Otero



A frase, justamente adoptada como título deste primeiro trabalho de longa duração de Susana Otero, foi proferida por um jornalista quando entrevistado após ter sido largamente noticiada a sua morte...
Partindo de textos de José Cardoso Pires, De Profundis - Valsa Lenta, a qual foi escrita depois do seu autor ter sofrido um acidente vascular cerebral que o privou da memória entre outros problemas, e de Fumar ao espelho, um monólogo de caracter autobiográfico, Susana Otero faz um exercício cheio de ironia, reflectindo sobre a vida e a morte – a morte branca como lhe chama José Cardoso Pires, e a outra, bem mais negra e mais abrangente -, e sobre a própria dança contemporânea e o seu poder enquanto arte performativa.
Sempre com um cuidado cheio de ternura pelas «criaturas» que põe em cena, Susana Otero faz apelo a uma empatia e cumplicidade por parte do público; o qual está, face a este espectáculo, como quem se expõe ao sol, gozando o seu calor aprazível ou sofrendo as queimaduras dos seus raios mais fortes.
Em palco dois homens e uma mulher, perdidos como só Godot à espera de si próprio (a referência Beckettiana faz aqui todo o sentido) o espectáculo desenrola-se entre a palavra - esse movimento da voz –, e a dança – essa voz do corpo -, entrelaçando-se, sem nunca se atropelarem nem invadirem, com um à vontade alheio a quaisquer dogmas de cruzamento interdisciplinar ou a fenómenos de moda nos processos criativos, ilustrando, bem, o melhor de um certo exercício da contemporaneidade.
«E agora José?
...Você marcha José!
José, para onde?»
«José, ao espelho, encolhe os ombros.»

BCN, 2011


Concepção, direcção e coreografia  Susana Otero 
Apoio dramatúrgico Luis Carolino
Interpretação e criação  Sara Leite, Rui Marques e Flávio Rodrigues 
Música Quarteto Dissonante, W. A. Mozart
Desenho de luz  João teixeira
Figurinos Susana Otero /Luis Carolino
Design Gráfico  Patricia Costa
Produção BCN

CHE DIAVOLO FATE? de Luís Carolino


Tendo como matéria de trabalho o universo do espectáculo de ópera oitocentista, Che Diavolo Fate? desenvolve-se à volta de tudo aquilo que faz com que a paixão pela ópera enquanto género artístico se mantenha e perdure: um sentir que ultrapassa toda a lógica; um excesso que nunca é suficiente; uma loucura trágica e uma raciocínio dramático que, sim, as mais das vezes não fazem sentido, mas que são irresistíveis.

Um tributo, também, à voz humana enquanto instrumento, quase um fetiche, que sempre me fascinou.
Luís Carolino, 2009

Ficha Artística:

Criação, Direcção e Composição Coreográfica: Luís Carolino
Música: La Traviata, de Guiseppe Verdi (excertos)
Banda Sonora e Sonoplastia: Luís Carolino
Criação e interpretação: Susana Otero, Rui Marques, Sara Costa Leite e Flávio Rodrigues
Figurinos: Luís Carolino
Desenho de Luzes: João Teixeira
Execução de figurinos: Ana e Rosa Almeida
Canto e apoio vocal: Pedro Teles
Carpintaria: Ricardo Santos
Design Gráfico e fotografia: Patricia Costa

NOCTURNO de Luís Carolino

 


Uma mulher da vida, um homem solitário e uma falsa suicida habitam um espaço vazio.
Nocturno assume-se como uma visita à vida destas três personagens guiada pela própria Morte, a quarta personagem em cena, que nos fala a todos na primeira pessoa; fala-nos de si, do seu «trabalho», e de como nos vê. Um olhar muito próprio, implacável, terrível, mas, ao mesmo tempo, quase maternal: uma reflexão sobre esse incrível e improvável grão de tempo que é a nossa vida, o tudo-nada durante o qual somos.
Nocturno é uma incursão no nosso lado mais escuro, não necessariamente o nosso lado mais negativo, apenas o mais privado e secreto; o lugar de todos os medos e todas as ternuras, o reino da sensibilidade, da intimidade; o sítio onde nos encontramos com nós próprios.
Uma certa e solitária melancolia encontra-se com o mal de vivre contemporâneo deste nosso mundo que parece ter perdido o pé.
Isto assusta-nos, muito, mas é preciso não ter medo.

Luís Carolino, Maio 2008